A nossa equipa da SPEA regressou recentemente de mais uma expedição à Reserva Natural das Ilhas Desertas, onde, durante duas intensas semanas, se dedicou à monitorização das aves marinhas, mais especificamente cagarras (Calonectris borealis) e almas-negras (Bulweria bulwerii).

 

Durante a travessia entre ilhas, foram surpreendidos por diversas espécies:   almas-negras, inúmeras jangadas de cagarra e até mesmo golfinhos-roazes (Tursiops truncatus) que brindaram a equipa com a sua presença junto ao barco em que navegavam.

Catarina Varatojo

Na chegada à Fajã da Doca, a rocha nua e a vegetação rasteira quase inexistente, faz parecer o nome Desertas apropriado. Mas apesar da aparente inospitalidade destas ilhas, não é necessário caminhar muito para encontrar fauna e flora únicas no mundo. Autênticos tesouros de vida selvagem que lutam diariamente com as adversidades desérticas, tão características da área. Ao nível da avifauna, foi possível observar, por exemplo, corre-caminhos (Anthus berthelotii), endémico dos arquipélagos das Canárias e Madeira, e canário-da-terra (Serinus canaria), espécie endémica dos arquipélagos dos Açores, Canárias e Madeira. No que diz respeito à flora, foi possível identificar espécies de  Mesembryanthemum sp., Matthiola maderensis, Echium plantagineum, Suaeda vera e Euphorbia piscatoria.

Catarina Varatojo

A estadia teve como objetivo a prospeção e monitorização de ninhos de cagarra e alma-negra, trabalho este que é realizado durante as diversas fases reprodutoras destas aves. Encontramo-nos na fase de incubação, período em que os casais reprodutores permanecem nos ninhos a incubar os ovos. Esta monitorização é essencial para avaliar a taxa de abandono dos ovos e estimar o número total de casais reprodutores na área, indicadores fundamentais para compreender o sucesso reprodutivo das espécies. Posteriormente, os juvenis abandonarão os seus ninhos e iniciarão as suas primeiras viagens em direção ao mar, durante os meses de setembro, para as almas-negras, e outubro/novembro, para as cagarras juvenis.

 

A equipa dedicou-se a diversos trabalhos, nomeadamente, a monitorização dos ninhos através de plots. Esta metodologia consiste na delimitação de uma área, neste caso circular, tendo sido possível identificar 36 dos 40 pontos previstos. Para além disso, foi possível identificar cerca de 50 novos indivíduos, através do método de anilhagem, onde também são retirados dados biométricos destas aves, contribuindo para uma base de dados essencial para estudar o comportamento, a longevidade e a reprodução destas espécies.

 

Foram também instalados pequenos dispositivos de seguimento (GPS e GLS) em várias cagarras, permitindo-nos acompanhar os seus movimentos no mar e estudar o impacto da poluição luminosa nas suas rotas de voo.

Luísa Rocha

Recolha de dados biométricos de cagarra.

A equipa continuará assim o trabalho de monitorização nas Ilhas Desertas: com mais de 100 ninhos de almas-negras e mais de 50 ninhos de cagarras a serem acompanhados até ao fim desta época reprodutora, onde cerca de 25 ninhos de cagarra têm casal reprodutor já com ovo. No caso das almas-negras, cinco dezenas de casais já estão a alimentar as suas crias, sendo que o primeiro ovo a eclodir foi a 23 de julho.

Catarina Varatojo

Cria de cagarra recentemente eclodida.

Este trabalho só é possível graças ao apoio e sinergia com outras instituições. A equipa gostaria de agradecer, nomeadamente, ao IFCN – Instituto de Florestas e Conservação da Natureza, parceiro do projeto LIFE Natura@night, que sempre possibilitou a estadia nas ilhas Desertas. Ao corpo de Vigilantes da Natureza, pelo companheirismo e apoio durante as estadias. E, finalmente, à empresa VMT Madeira, pela disponibilidade e ajuda nas travessias entre ilhas.

Catarina Varatojo